O ano de 2006 é muito importante na minha trajetória. Um ano após meu acidente, precisei retornar ao Ensino Médio e estudar mais 2 anos para me formar. Na minha cabeça, apenas o Ensino Médio bastaria. Retornei para o colégio sem nenhum tipo de habilidade com a mão esquerda. Carregava meu caderno na mochila e contava com a ajuda dos colegas, quando era preciso copiar do quadro ou fazer algum trabalho. Os professores que me conheceram antes do meu acidente, me auxiliavam. Neste contexto que conheci a professora Márcia, que fazia parte das professoras que não me conheciam, só ouvira falar da minha historia. Entretanto, assim que me conheceu, foi totalmente colaborativa comigo. Que professora maravilhosa. Sentava do meu lado nas provas e anotava tudo que eu dizia. Jamais esquecerei. Eu não entendia nada sobre liderança, política, negociações. Mesmo assim, acabei sendo eleito o líder da turma. Achava que precisava lutar com unhas e dentes pelos interesses dos colegas. Acabei me prejudicando, logo com a Márcia, que tanto me auxiliou. Escreverei sobre o que aconteceu e como contornei. O que quero ensinar é bem simples: Não confronte professores. Não vale à pena...
A professora Márcia dava aula de Física. A matéria em questão não é algo fácil, que todo aluno morre de amor; são cálculos bem complicados e as teorias difíceis de serem absorvidas. No decorrer daquele ano, conforme conhecia meus colegas, os comentários sobre a professora Márcia se repetiam: diziam que ela não era de brincadeira e que reprovava diversos alunos. Comigo ela era extremamente compreensiva; não conseguia imaginar ela sendo ruim. No entanto, verdade seja dita: nas aulas dela, a turma ficava em silêncio e prestava atenção. A Márcia tinha um domínio incrível sobre a turma. E eu, era o queridão; não firmava parceria com nenhum grupo específico e me dava super bem com todos. Por ser assim, bom relacionamento interpessoal, acabei sendo eleito o líder da turma. A Márcia costumava dar um trabalho (uma vez ou duas por ano, não recordo) que era muito difícil. E ela queria que fosse feito a mão, nada digitalizado. Lógico que, por entender meu caso, deixou uma colega fazer por mim; a Telma, se mal me engano. Os colegas odiavam aquele trabalho; capa, contracapa, desenvolvimento, referências... E por aí vai!! E, por causa desse trabalho, meus problemas começaram. Meus colegas me procuravam para reclamar da Márcia; exigiam um posicionamento. Então, eis que me posicionei, de forma errada, claro. Ao invés de chamar a Márcia em particular, pedir para ela pegar leve e abrir negociações comigo, líder da turma... Fiz ao contrário: bati de frente e acabei expondo ela. Enquanto argumentava, ferozmente, ela só me olhava. Na primeira prova, após a discussão, senti a força da Márcia. Ela entregou as provas e me olhou: "Chama alguém que está no pátio e pedi para te ajudar, porque eu, não vou mais te ajudar nas provas." Aquilo foi um choque terrível. Percebi que havia perdido meu maior apoio. E agora, como vou fazer? Aos trancos e barrancos, consegui passar. Passei de ano, mas minha relação com a Márcia seguia abalada. Eu precisava urgentemente conquistar o apoio da Márcia de volta, mas sabia que seria difícil. No ano seguinte, ela se preparou para dar um golpe de misericórdia.
As aulas do ano de 2007 transcorriam tranquilamente. O terceiro ano, o último para se livrar dos estudos. (Assim pensava. Hoje, estou ciente que vou morrer estudando.) Naquele ano, eu parecia um cachorrinho pedindo atenção para seu dono. Cumprimentava a Márcia, puxava assunto, fazia perguntas... Tudo para ficar de bem com ela. Uma época, chamei ela e pedi desculpas pela discussão do ano anterior. Ela apenas sorriu e disse que estava tudo bem. Apesar disso, no fundo, eu sabia que ela não tinha perdoado. Uma vez mais, fui eleito o líder da turma e, mais do que isso, líder do grupo que cuidava da formatura. Estava sendo um ano perfeito. E quando tudo está perfeito, precisamos tomar mais cuidado. Eis que o tal trabalho da Professora Márcia surgiu no meu caminho. Diferente do ano anterior, desta vez não falei nada; a turma argumentava e a Márcia respondia. De repente, a Márcia sentenciou e bateu no meu ponto nevrálgico:
- Mateus, esse ano, ninguém vai fazer o trabalho por ti. Pedi para tua mãe, teu pai, irmãos, vizinho... Sei lá, alguém precisa te ajudar. Não é viável outro colega fazer, porque vai se sobrecarregar.
Fiquei gelado. Totalmente sem reação. Era o golpe de misericórdia. Intelectualmente falando, não havia condições de contra-atacar. A Márcia era inteligente, e eu, como a maioria dos alunos do Ensino Médio, um cérebro de ervilha. O que fazer? Quase chorei. De repente, do nada, a turma começou a me defender. Pediram que deixasse eu digitalizar. A Márcia, insistente, relutava em aceitar. Até que usou uma estratégia muito, muito forte; beirando a covardia.
- Se o Mateus não pode fazer o trabalho, então acabou. Vão fazer uma prova, ao invés de trabalho.
A Márcia tinha jogado a turma contra mim. Eles teriam que fazer uma prova, e a culpa era minha. A turma me odiaria. Assim que acabou a aula da Márcia, meus colegas vieram falar comigo. Achei que me xingariam ou algo parecido. Pelo contrário, vieram me agradecer; preferiam mil vezes a prova do que o trabalho. Claro, meia duzia queria o trabalho, mas a maioria estava do meu lado. Eu consegui, sem querer, me esquivar de um ataque mortal da professora Márcia. Depois de um certo tempo, acho que ela descobriu que a turma havia me apoiado. Minha relação com a professora Márcia melhorou. Sorríamos mais e conversávamos. As feridas do passado foram cicatrizando. Até tiramos fotos juntos. Eu não sei o que ela queria fazer. Aprendi uma grande lição. Desde então, nunca mais confrontei professores. Ela está no meu Facebook e somos amigos. Anos depois, apareci no colégio e conversamos bastante. Sim, agora tenho cérebro mais desenvolvido para conversar sobre diversos assuntos.
Escrevi uma historia que aconteceu quase 10 anos atrás. Não detalhei muito porque, sinceramente, não recordo. A historia é secundaria. O que importa, de fato, é o aprendizado. Nunca compre briga com professores por causa da turma. Não vale à pena (...) Chama em particular, conversa e mostra teu ponto de vista. A Márcia nunca reprovou ninguém. Não é o professor que reprova, mas sim, o próprio aluno. Basta demonstrar interesse, buscar aprender, entender e aplicar o que é ensinado. Simples. Se souber a matéria, não existe professor que reprove. Eu garanto; basta saber a matéria. Os professores reprovam quem não se dedica, quem não quer nada com nada. Na atualidade, estou cursando Ensino Superior e sigo sendo o queridão da turma. Não confronto meu professor, apenas o desafio intelectualmente. Como faço isso? É uma outra historia...
Eu adoro a Márcia, admiro e respeito.
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